Hoje a noite é passada num acampamento diretamente nas
margens do rio Cunene. À nossa frente, na outra margem do rio, elevam-se
grandes dunas de areia fina e encarniçada, já no lado namibiano. A lua ainda
não está cheia, mas com a ajuda dum céu totalmente estrelado, ilumina o
acampamento. Apesar de estarmos na época do cacimbo, o rio está com algum
caudal e romanticamente ouvimos o marulhar das águas. Estamos a 30 km da foz.
Vai ser de certeza uma noite fantástica, diferente.
A chegada foi espetacular – mas algo desorganizada. O
deserto do Moçâmedes, agora deserto do Namibe, é tão espetacular como no outro
lado da fronteira. Um deserto com várias personalidades, várias facetas. Logo à
saída da cidade do Namibe, parámos para prestar homenagem ao antropólogo de
origem portuguesa Ruy Duarte de Carvalho que pediu para que as suas cinzas
fossem enterradas no deserto, sob um monte de pedras, como tradicionalmente os
sobas herreros são enterrados. Este regente agrícola de formação e antropólogo
de coração dedicou-se a estudar as várias tribos herrero do Namibe. A sua
principal obra, “Vou lá visitar pastores”, está eternizada neste monumento.
Passados alguns km, saímos do alcatrão e entrámos numa pista
fantástica através do deserto que nos permitiu andar a 150! Mais velozes do que
na autoestrada! A felicidade durou porém somente uns 60 km. Pedras pequenas soltas, areia, pedra cortante
ou pedra-faca (montanhas de xisto com formações exóticas), montes e vales e até
um desfiladeiro fizeram com que a caravana de jipes se desorganizasse. Os furos
seguiam-se uns após os outros.
Tudo isto não impediu porém que nos espantássemos com a
beleza da paisagem. Primeiro um deserto de pedra onde despontavam inúmeras
welwitchias miriabilis, incluindo uma de 1,65 m de altura e com um diâmetro de
XXX. Estas plantas são endémicas, existindo somente aqui em Angola e na
Namíbia. Chegam a ter milhares de anos, sobrevivendo sem água e com sol.
A Welwitschia
Mirabilis é uma planta milenar contemporânea dos dinossauros apenas
existente no deserto do Namibe, em Angola e na Namíbia. Esta espécie vegetal
foi descoberta a 3 de Setembro de 1859 pelo botânico explorador austríaco
Frederich A. Welwitsch. A Welwitschia
é uma planta da família das gimnospérmicas adaptada à vida nas regiões
desérticas. É uma planta de caule de grandes dimensões, com a forma de um
gigantesco cogumelo dilatado e côncavo de 50 a 75 cm de altura que parece
partida pelo golpe de um machado em tiras. As suas grandes folhas, duras e
muito largas, deitadas no chão, arrastam-se pelo deserto podendo atingir dois
ou mais metros de comprimento. As suas flores são unisexuadas. Os estames
masculinos atingem aproximadamente 6 cm (antenas com 3 divisões) localizam o
óvulo estéril envolto pelo periano.
É tão diferente, morfologicamente de todas as espécies
botânicas conhecidas, que não se inseria em nenhum dos géneros já descritos
pela Ciência. Houve, por isso, a necessidade de criar um género novo, o qual
ainda se conserva, como uma única espécie consequentemente.
Passado algum tempo, entrámos então no Parque Nacional do
Iona, uma zona protegida com uma superfície de 15 150 km2. Flora muito
reduzida, de quando em quando uns burros, umas gazelas, umas cabras,
uns nguelengues e uns orixes. Dizem que também ali vivem elefantes,
impalas, zebras, onças, leões, avestruzes e rinocerontes. Seres
humanos vimos somente dois pastores, mais ninguém.
O almoço foi servido na Espinheira, debaixo dumas grandes
espinheiras com uma sombra magnífica. Parecia uma cena tirada do “Out of
Africa”: uma comprida mesa com toalha, pratos de porcelana, copos de pé alto. E
um enorme panelão de salada de atum e grão.
A paisagem é típica de savana africana. Paisagem a perder de
vista, ao longe uns montes, capim amarelo baixo, e junto ao Cunene, umas magníficas
dunas. O sol punha-se e a areia ficou com uma cor alaranjada.
Quando chegámos ao acampamento, as tendas estavam montadas,
o “restaurante” pronto para receber os raidistas, WCs e duches. Um luxo no meio
do deserto.