segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Romaria da Senhora da Agonia: A rainha das festas portuguesas

Ao longe já se ouvia o ribombar dos bombos. Quando chegámos à Praça da República em Viana do Castelo o barulho era ensurdecedor. Centenas de pessoas acotovelavam-se à volta do secular chafariz para ver os gigantones, os cabeçudos e os Zés Pereiras, não se incomodando com o barulho. Festa é festa e não há festa como a Romaria da Senhora da Agonia.
Em Portugal, o culto à Virgem Maria com o título de Senhora da Agonia, padroeira dos pescadores locais, surgiu em 1674 quando a imagem da Senhora da Agonia entrou na Capela do Bom Jesus do Santo Sepulcro do Calvário em Viana do Castelo.
Em 1772 começou a romaria anual, nascida da devoção dos homens do mar vindos da Galiza e de todo o litoral português, e que incluía celebrações religiosas e pagãs. Mais tarde, em 1783, a Sagrada Congregação dos Ritos (conhecida agora como Capela de Nossa Senhora da Agonia) permitiu que fosse celebrada nesta capela uma Missa Solene, todos os anos no dia 20 de agosto.
Em 1906, começou a ser incluída nesta romaria a Festa do Traje que se transforma, em 1908, numa Parada Agrícola que deu lugar ao atual Cortejo Histórico-Etnográfico. A partir de então a romaria deixou de estar limitada ao Campo da Agonia e invadiu toda a cidade de Viana do Castelo.

Atualmente as Festas da Senhora da Agonia têm uma duração de uma semana. Todos os dias, ao meio-dia, doze morteiros misturam-se com ribombar característico dos bombos, dando início à Revista de "Gigantones e Cabeçudos", onde se juntam mais de 200 tocadores de bombos e duas dezenas de figuras.




Os pontos altos que levam os espectadores ao delírio são os vários despiques entre tocadores de bombos e gaiteiros. No momento de despique entre todos os grupos de bombos, o som ouve-se em praticamente toda a cidade, chegando por exemplo até Darque. É gigantesco o esforço despendido durante o despique, chegando um tocador de bombo a perder entre 800 a 1.000 calorias! 








Um bombo grande pode pesar cerca de 12 quilogramas e um gigantone três vezes mais. Por isso, durante os vários desfiles, os gigantones têm de parar a sua vertiginosa dança à roda e ser pousados para os homens que os carregam poderem repousar – e acima de tudo, apanhar ar e beber água.


Na véspera do principal cortejo, o Desfile Histórico-Etnográfico, ao final da tarde, tem lugar o Desfile da Mordomia, durante o qual mais de 400 mulheres desfilam pelas ruas de Viana do Castelo, envergando os trajes típicos da cada freguesia. Atualmente, o Desfile da Mordomia simboliza um “cumprimento” da organização da Romaria d’Agonia às entidades oficiais.
As mordomas desfilam orgulhosamente pelas principais artérias da cidade, sempre acompanhadas pelos bombos, pelos gigantones e pelos cabeçudos e enchendo-se da típica “chieira” para mostrarem diferentes trajes e peças de ouro seculares – algumas mordomas chegam a carregar dezenas de quilos de ouro, reunindo as peças de família e amigos num único peito - estimou-se em cerca de 14 milhões de euros o valor das centenas de quilos de peças de ouro usadas pelas mordomas neste desfile.

É uma tradição que passa de mães para filhas. Há mordomas que desfilam continuamente neste quadro da Romaria d’Agonia há mais de 50 anos
No sábado das Festas realiza-se o famosíssimo desfile histórico-etnográfico, admirado por milhares de pessoas vindas de todo o mundo, no qual, num percurso de 2.300 metros ao longo das ruas da cidade, as freguesias do concelho mostram o seu melhor à cidade e aos forasteiros.
Com mais de 3 000 participantes, o cortejo é um verdadeiro museu vivo. Através de uma centena de quadros e dezenas de carros alegóricos, atualmente puxados por tratores mas antigamente por juntas de bois, mostram a História de Viana do Castelo e os seus usos e costumes.
Durante o desfile, os participantes atiram para o ar grãos e espigas de milho, distribuem, em andamento, pedaços de broa, rodelas de chouriça, azeitonas ou mesmo copinhos de vinho verde tinto.
Este ano, tiveram especial destaque as comemorações do 60º aniversário do Santuário de Santa Luzia, cuja construção foi começada em 1904 e só terminada em 1959. O responsável pelo projeto foi o arquiteto Manuel Terra Ventura. O longo período de construção deveu-se ao facto de a 5 de outubro de 1910 ter sido implantada a República. A consequente Lei da Separação do Estado da Igreja foi outro obstáculo que surgiu. Finalmente as obras foram retomadas em 1926, sob a direcção de Miguel Nogueira. 
A sua instituição deve-se ao Capitão de Cavalaria Luís de Andrade e Sousa que, tendo um grave problema de visão, pede auxílio a Santa Luzia, advogada da vista e cujo atributo são os seus olhos dispostos numa bandeja. Tendo ficado curado, agradece a graça recebida com a construção de um santuário no local da antiga pequena ermida medieval dedicada.
Do cimo do monte tem-se uma espetacular vista soberba de 360º sobre a região.
Em 1923 foi inaugurado o Elevador de Santa Luzia, conhecido como Funicular de Santa Luzia, que liga a cidade ao santuário.