sexta-feira, 19 de julho de 2019

O castelo de Dover





Estávamos a passar uns dias em Kennington, no sul de Inglaterra, e procurámos no FaceBook “Eventos grátis perto de ti”. A primeira sugestão que nos saltou foi “Jubileu 50. Castelo de Dover”. Entrada gratuita – o preço normal para adulto é de £20.90 (€24). Só havia duas condições: “comprar” os bilhetes e chegar até às 11h15. Achámos que era uma maneira fantástica de visitar gratuitamente o castelo de Dover e nem fomos ver de que se tratava. Calculámos – erradamente como verificámos depois – que “Jubileu 50” seria algo relacionado com algum jubileu da Rainha Isabel. E como já há muito tempo queríamos ir visitar o castelo, pensámos que este seria o momento indicado.
No domingo partimos para Dover logo depois do pequeno-almoço. Junto ao castelo seguimos a indicação “Jubileu 50”, estacionámos sem problemas e logo se aproximou de nós um senhor que nos perguntou se já tínhamos os autocolantes. Respondemos-lhe que tínhamos os bilhetes. E ele deu-nos quatro autocolantes. Ao recebê-los estranhei terem o desenho de uma cruz e de um livro aberto. Mas mais nada pensei. Mais intrigada fiquei quando, à entrada do castelo, nos perguntaram se vínhamos para a missa. Missa? De repente começámos a perceber tudo: o Jubileu 50 era a festa do 50º aniversário da ordenação de um padre que trabalhou em diversas dioceses e na paróquia de Dover. Agora tínhamos o puzzle completo! No largo interior estava montado um altar e muitas cadeiras para a missa. Tivemos assim uma visita a este castelo medieval com apoio espiritual.
O castelo, conhecido como a "Chave da Inglaterra", devido à sua importância defensiva ao longo da história, foi construído no século XII. No entanto as suas origens são romanas, havendo ainda as ruínas de um farol romano de 24 m de altura, que terá sido construído por volta do ano 43 a.C.. É um dos três faróis romanos no Reino Unido que ainda perduram até hoje.
o farol romano
O local onde mais tarde foi construído o castelo era um dos primeiros pontos de entrada dos normandos na ilha. Depois da Batalha de Hastings a 14 de outubro de 1066, Guilherme o Conquistador e o seu exército marcharam até à Abadia de Westminster para a sua coroação.
Logo marcharam para Dover, que foi referido inexpugnável e defendido por uma grande força. Os ingleses, cheios de medo ao vê-los aproximarem-se, não tinham confiança nas suas muralhas, nem na força natural do local, nem no número de suas tropas [...] Enquanto os habitantes se preparavam para se render sem condições, nossos homens, ansiosos pelo espólio, atearam fogo à fortaleza que imediatamente foi tomada pelas chamas. [...] Depois de tomar posse do castelo, o duque passou oito dias acrescentando novas fortificações.
Calcula-se que o cronista se estivesse a referir a novas fortificações feitas num forte saxão ou mesmo num burgo construído à volta da igreja saxónica de Santa Maria em Castro, embora as evidências arqueológicas sugiram que terá sido feita uma nova fortificação.
Henrique II (1133 – 1189) começou a construção do atual castelo na década de 1180. A torre de menagem é desta época, tendo sido uma das últimas a serem construídas em quadrado. Desde então o castelo tem sido adaptado para fazer face à evolução do armamento e até da arte da guerra.
Em 1216, um grupo de nobres rebeldes incentivou Luís VIII da França a usurpar a coroa inglesa. O rei francês tentou tomar o castelo, cercando-o, mas o seu ataque não teve êxito. Após esta tentativa de tomada do castelo, o vulnerável portão norte tornou-se uma passagem subterrânea para o complexo defensivo e novas portas externas foram construídas na parte oeste e leste. Durante o cerco, os ingleses cavaram um túnel para o exterior e atacaram os franceses, criando assim o único túnel de contra-ataque do mundo.
Durante as guerras napoleónicas no final do século XVIII, o castelo sofreu grandes obras para melhorar as defesas. Uma das grandes obras foi a remoção do telhado da torre, que foi substituído por abóbadas de tijolo. Assim, pôde instalar artilharia pesada no telhado. Como Dover se tornou o local para o acantonamento das tropas, houve que construir quartéis e armazéns para aquelas tropas e seus equipamentos. A solução adotada foi a criação dum complexo de quartéis e túneis 15 metros abaixo dos penhascos, onde chegaram a estar alojados 2 000 soldados! São os únicos alojamentos subterrâneos construídos na Grã-Bretanha.
No final das guerras napoleónicas, os túneis foram parcialmente convertidos e usados pelos serviços costeiras no combate ao contrabando. Durante a II Grande Guerra os túneis foram convertidos em abrigo antiaéreo e depois num centro de comando militar e hospital subterrâneo. Em maio de 1940, o almirante Sir Bertram Ramsey dirigiu a evacuação de soldados franceses e britânicos de Dunquerque, a famosa Operação Dynamo, a partir desses túneis. A sua utilização foi tão intensa que foi necessário construir um novo túnel.
Depois da Guerra, os túneis foram usados com bunker em caso de ataque nuclear. O plano foi abandonado quando se percebeu que a pedra usada na construção – giz – não oferecia proteção à radiação.



quarta-feira, 17 de julho de 2019

A anta de Monte Abraão


Muitas vezes conhecemos o mundo inteiro, mas não sabemos o que está ao virar da esquina da nossa casa. Foi um pouco o que me aconteceu. Desde que moro em Queluz que sabia que havia uma anta no Monte Abraão. Há muitos anos quis lá ir com os meus filhos, mas, na altura, aconselharam-me a não ir porque a zona não seria recomendável.
Finalmente hoje, procurei a anta no mapa do Google, calcei os meus ténis e meti-me a caminho. Segundo o mapa, a anta estaria a 1.8 km da minha casa. 28 minutos a andar. Metade do caminho fez-se bem. Graças ao novo eixo verde-azul seguimos sempre paralelo ao rio Jamor. Mas a meio do caminho começou o troço mais difícil: a estrada é muito, mesmo muito inclinada até chegarmos ao cimo do monte. Para piorar a situação, o vento era muito forte, tendo algumas vezes dificuldade em nos mantermos de pé.
Até que chegámos ao final da zona de casas e à nossa frente só tínhamos o “monte dos vendavais”. No cimo, os postes de alta tensão assobiavam. E o vento era ainda mais forte, ali no cimo do monte. Sem nada a prendê-lo, podia soprar à vontade, fazendo os fios dos cabos de alta tensão assobiarem ainda com mais força.
Metemo-nos pelo descampado. Num caminho de cabras que passa mesmo por debaixo dos cabos de alta tensão. Os campos magnéticos debaixo desses cabos são forte. O meu telemóvel “morreu” apesar de ainda ter mais de 50% de bateria e eu senti-me muito tonta, a cambalear.
Até que por fim lá vimos as pedras ainda existentes da anta. Foi em 1876 que este monumento funerário foi descoberto pelo engenheiro militar e geólogo Carlos Ribeiro. As suas escavações sugerem que serviu de túmulo para 80 pessoas e que deve ter sido erigido em meados/finais do Neolítico, entre o ano 4000 e 2500 a.C. A anta foi constituída por uma câmara com 3,6 metros de diâmetro, e um corredor com 2 m de largura e 8 de comprimento, orientado a Este. As pedras usadas na construção deste monumento funerário foram trazidas dos arredores. O solo também foi convenientemente preparado para a edificação do dólmen. As escavações realizadas na Anta do Monte Abraão forneceram uma indústria típica muito variada constituída por placas de xisto, cilindros de calcário, pontas de seta, cerâmica e ossadas humanas.
Esta necrópole terá tido três sepulcros. A anta que ainda se pode ver terá tido seis esteios (pedras verticais) assentes diretamente na rocha. O chapéu, a laje de cobertura, já não existe. Segundo o arqueólogo Vergílio Correia Pinto da Fonseca haveria pinturas rupestres na superfície no esteio maior da cabeceira, que eu não pude confirmar. Estes desenhos teriam carácter antropomórfico, representando um elemento masculino e um elementos feminino.  No local terão igualmente sido encontrados vários objetos como cabeças de flechas, cerâmica, ferramentas de pedra, que poderão ser vistas no Museu Geológico.
Apesar de estar classificado este dólmen está praticamente abandonado. Veremos se não se estraga..