sexta-feira, 18 de junho de 2021

Tenerife, vulcões e… um pouco de Portugal

O Teide emvolto em neblina

A Ilha de Tenerife é a maior das sete ilhas que formam o arquipélago das Ilhas Canárias. Quando pensamos em Tenerife, vem-nos logo à ideia vulcões, praias de areia preta, mas nunca associamos a Portugal. E, no entanto, estamos bem ligados. A começar por um dos pratos mais típicos da ilha: o mojo verde e o mojo rojo, que acompanham todos os pratos, especialmente as papas arrugadas. Como assim? Nos primórdios do seu povoamento, esta ilha teve influência portuguesa, que se manteve até hoje. 
Quem me chamou à atenção foi a nossa guia, Maria. Estávamos a atravessar o bosque de pinheiros antes de se chegar à famosa paisagem lunar salpicada de vulcões, quando ela me falou da importância do negócio da resina durante mais de 300 anos e que esteve nas mãos de famílias portuguesas. “Os Portugueses sabiam como extrair a resina dos pinheiros e como ela era importante para a impermeabilização dos barcos”. Mas sobre as influências portuguesas falaremos mais adiante. Comecemos pelo princípio. 


Como surgiram as ilhas? 
Há 20 milhões de anos estas ilhas atlânticas, como muitas outras, não existiam. Mas após uma forte erupção vulcânica surgiu a ilha de Fuerteventura, a primeira ilha do arquipélago a separar-se de África e a que está mais perto da costa africana, a somente 100 km. Seguiram-se as outras ilhas e ilhotes e, há 3 milhões de anos, novamente após uma erupção vulcânica três destes ilhotes fundiram-se e formaram a ilha de Tenerife. 
Ao longos dos anos, a ilha foi mudando de tamanho, de forma e de altitude – sempre devido à atividade vulcânica. Vários montes foram saindo da água, outros foram colapsando para a água. Há 200 mil anos, saiu da água o Teide, o monte mais jovem da ilha – e, com os seus com seus 3 718m, a montanha mais alta de toda a Espanha. No total há mais de 320 pontos de vulcões em Tenerife! 





O povoamento 
Numa ilha onde só há vulcões, a vida era muito inóspita para o ser humano. Ao início só havia alguns animais endémicos, como lagartos, ratos ou tartarugas. 
Os vestígios mais antigos da presença humana na ilha de Tenerife datam do século X a.C. O povoamento permanente da ilha ocorreu provavelmente de forma contínua ou em várias ondas entre o século V a.C. e o século I d.C. Devido à proximidade da costa africana, sempre houve povos visitavam a ilha. Os Romanos paravam muitas vezes em Nivaria, o nome que davam à ilha a partir da palavra nix, nivis, que significa "neve", numa referência à neve, quase que perpétua no topo do vulcão El Teide. O nome atual de Tenerife também se refere ao vulcão. Os Guanches, um povo da ilha vizinha de La Palma, chamavam ao Teide “Tene” (“montanha”) e “ife” (“branca”), tendo sido o “r” adicionado pelos Espanhóis. Para os nativos de Tenerife, a ilha era chamada Chenech, Chinech ou Achinech. 
Pedras pedras pedras
Entre o século I a.C. e o século I d.C., existiam estreitos laços económicos entre a zona mediterrânica e as Ilhas Canárias. O mais tardar com a crise imperial do século III no Ocidente, as relações das ilhas com a Europa chegaram ao fim. 
Como os Guanches, os habitantes originais da ilha de Tenerife, não tinham qualquer conhecimento náutico, as ligações entre as ilhas também se romperam. Durante os mil anos seguintes, os Guanches de Tenerife estiveram praticamente isolados e desenvolveram uma cultura claramente distinta dos canários das outras ilhas. Por altura das Descobertas havia em Tenerife nove pequenos reinos guanches, denominados menceyatos. Uma expedição patrocinada pelo nosso rei D. Afonso IV visitou as Ilhas Canárias em 1341. Um relato disto, provavelmente escrito por Niccoloso da Recco, um dos líderes desta viagem, dá informações precisas sobre as peculiaridades de algumas das ilhas. 
Em 1345 Portugal reclamou a posse das ilhas, pois enquadravam-se no plano expansionista do país. Sucederam-se vários conflitos com os castelhanos, que também reclamavam todas as ilhas do arquipélago. 
D. Beatriz de Portugal, mãe de D. Manuel I, teve um papel ativo na política, que se estendeu ao reinado de três reis (D. Afonso V, D. João II e D. Manuel I). Sendo Infanta de Portugal e Duquesa de Beja, ajudou a concretizar as pazes com Castela, encontrando-se pessoalmente com a sobrinha, a rainha Isabel de Castela na vila de Alcântara em 1479 para discutir o que veio a ser o Tratado das Alcáçovas, o primeiro do género, que regulamentava a posse de terras ainda não descobertas, ao abrigo do qual as Canárias passavam para o domínio castelhano, mas em contrapartida do que daí para Sul tudo era português. Este tratado foi a base do futuro Tratado de Tordesilhas. 
Quando Colombo saiu de Palo em agosto de 1492 na sua primeira viagem, dirigiu-se para o arquipélago das Canárias, tendo aportado em Gomera (Gomeira), que era a ilha "portuguesa" das Canárias, onde o Infante D. Henrique criara uma base para as suas explorações atlânticas. Foi aliás desta ilha que ele observou uma erupção vulcânica em Tenerife.

Interesses económicos 
Mas que interesses económicos havia em Tenerife, uma ilha dominada totalmente por vulcões, sem riquezas do subsolo, e com dificuldades de produção agrícola, devido à natureza vulcânica do solo? 

Torre de joias encarnada
Torre de joias encarnada
 

Além de algumas plantas endémicas, como a belíssima torre de joias, ou viperina de Tenerife (“tajinaste”, em castelhano), há uma série de plantas introduzidas pelos Europeus há 400 anos, entre elas as amendoeiras, as figueiras e os catos chumbeira, também conhecidos por figueira-da-índia. Estes catos, trazidos do Novo Mundo, do México, estiveram na base de um grande negócio que rapidamente se espalhou por toda a ilha: o fabrico de colorante carmim, tanto para a indústria alimentar como para a indústria têxtil. Não que o cato fosse a base do carmim, mas sim a cochonilha, um pequeno inseto que vive nestes catos. Para se defender da predação por outros insetos, a cochonilha produz ácido carmínico, que extraído do seu corpo e ovos é utilizado para fazer o corante alimentício que leva seu nome. Porém, quando nos anos 1940 foram descobertos os corantes químicos, a indústria sofreu um grande revés. Muitas plantações de catos chumbeira foram abandonadas. Porém, alguns agricultores mantiveram-nas e mudaram o ramo da indústria com a qual colaboravam, passando a trabalhar os frutos para doce, marmelada e licor, e também para a indústria da cosmética e da saúde. 
Interessante que já na Antiguidade as Canárias eram procuradas pelos Romanos por causa de um líquen, urzela, comum sobre rochas costeiras nas ilhas desta região. A urzela produz um corante de cor púrpura (ou azul violáceo) que antes da invenção das anilinas sintéticas atingia grande valor para tingir têxteis. Para os Romanos era muito importante, pois usavam-no para tingir os tecidos com que faziam os mantos. 
Só como mera curiosidade, o valor da urzela era tal que nos Açores a sua produção era monopólio real, havendo severas penalidades para quem a contrabandeasse, sendo um dos mais importantes produtos de exportação das ilhas. O nome urzela deu origem a diversos topónimos nas ilhas atlânticas, entre os quais o da freguesia da Urzelina, na ilha de São Jorge. 
Não foram, porém, somente os catos que trouxeram riqueza económica à ilha. Os portugueses, que conheciam o segredo de extrair a resina e usá-la para impermeabilizar os barcos, expandiram as plantações de pinheiros-das canárias, uma planta endémica, e dominaram o negócio durante mais de 300 anos. 
Base do teleférico
Se o tempo o permitir, vale a pena tomar o teleférico que nos leva quase ao topo do vulcão Teide. Muitas vezes, porém, sopra a calima, um vento que vem do Saara que traz muito areia e torna a viagem impossível por razões de segurança. Se, por acaso, não conseguir subir, há sempre o plano B: uma visita ao Jardim Botânico, muito perto do local de onde o teleférico e onde pode ver as plantas endémicas da ilha. 
Torre de joias azul
Torre de joias encarnada
No caminho para o teleférico, há dois pontos de paragem obrigatória: Los Paleos e Roques de Garcia. 
Roques de Garcia é um local muito interessante. Parece a cratera de um vulcão, mas... não é. são formações rochosas excecionais localizadas no Parque Nacional do Monte Teide, Património Mundial da UNESCO desde 2007, e as suas formas verticais parecem guardiões da região. A área em redor de Roques de García é mais do que impressionante. À esquerda temos o Pico Velho, que tem uma elevação de 3 155 metros; e o majestoso Monte Teide fica à direita, com uma altura de 3 712 metros. Aliás o Roque Cinchado, localizado a cerca de 300 metros abaixo do cume do vulcão Teide, é formação rochosa mais famosa da ilha, pois a sua imagem, com o Teide atrás, estava nas notas de mil pesetas. 



Estas formações rochosas únicas foram criadas por milhões de anos de erosão que dividiram a grande caldeira vulcânica Las Cañadas em duas crateras (ou chaminés vulcânicas). Com o tempo, as formações rochosas foram absorvendo vários materiais vulcânicos que parecem ter pertencido a um imenso vulcão antigo que existia antes do Monte Teide. Muitas espécies vegetais endémicas agarram-se às formações rochosas, colonizando este mundo de lava. Aqui há grandes populações de lagartos, especialmente de lagartos Gallot. 
Las Cañadas e a planície de Ucanca, criada por pedra sedimentar, são os limites das caldeiras vulcânicas históricas que foram sofrendo erosão ao longo do tempo. Esta paisagem lunar foi a escolhida para algumas das filmagens do filme Confronto de Titãs (2010). 

Batatas 
Do Novo Mundo chegaram as batatas às ilhas Canárias e aí encontraram terreno fértil. As batatas passaram a ser a base da alimentação canarina. É aqui que se encontram o 2º maior número de variedades do mundo, mais de 300! 
Não nos admiramos assim de ver as papas arrugadas (“batatas enrugadas”) comidas com mojo verde (molho verde) ou com mojo picón (molho picante). Têm o aspeto das nossas as batatas ao murro. Usam-se batatas pequeninas, como as batatas novas, que se cozem com pele - antigamente em água do mar, atualmente em água com muito sal (para 1 kg de batatas, 300 g de sal grosso marinho!!!!) que se deixa evaporar, deixando as batatas enrugadas e com uma ligeira camada de sal. 
Sanchocho de cherne
O mojo verde (a palavra mojo vem da palavra portuguesa “molho”!) é feito com coentros e o mojo picón com pimentos picantes. Uma delícia! Acompanham muitos pratos como sanchocho de cherne, cherne cozido em água e especiarias ou conejo en salmorejo (coelho em marinada) – há tantos coelhos na ilha (não têm inimigos naturais!) – este salmorejo é a marinada onde o coelho fica a ganhar sabor e nada tem a ver com o salmonejo andaluz. 
E como se preparam as papas arrugadas? Leve ao lume numa panela alta 1 kg de batatas novas pequenas, 300 g de sal e 1 l de água quente. Deixe as batatas cozer em lume alto durante 25-30 minutos. Escorra a água e leve ao lume para secar totalmente as batatas. E o mojo verde? Muito fácil.
Papas arrugadas con mojo verde y mojo rojo
Antigamente era todo feito à mão. Hoje em dia utiliza-se a varinha mágica, um copo liquidificador ou a 1-2-3. Coloque num copo liquidificador 1 molho de coentros, 8 dentes de alho, 250 ml de azeite, 35 ml de vinagre, 1 colher de café de cominhos moídos e 1 colher de café de sal e reduza a puré. Está pronto.
O mojo picón faz-se assim: Coloque num copo liquidificador 8 dentes de alho, 2 pimentos picantes (2 pimientas piconas ou pimienta de la puta madre, típicas nas Canárias), 150 ml de azeite, 20 ml de vinagre, 1 colher de café de cominhos moídos, 1 colher de sopa de pimentão doce e 1 colher de café de sal e reduza a puré. Está pronto.

Barraquito

Para terminar a refeição nada como um barraquito: café com leite condensado, canela, licor 43, leite batido em espuma e casquinha de limão. Uma delícia!

 

quarta-feira, 2 de junho de 2021

Um raio de esperança – Tenerife abre-se ao turismo



Como muitos outros destinos, Tenerife tem sido afetada pela pandemia e a crise mundial do turismo, daí resultante. Durante meses e meses, esta ilha canarina esteve vazia, com apenas uma mão cheia de hotéis abertos.

David Pérez, CEO do Turismo de Tenerife, está otimista de que já se vê a luz ao fim do túnel.

David Perez (Fonte: Aviation-Event)

Tenerife é conhecida como um paraíso natural, um destino preferido por viajantes que gostam de atividades ao ar livre - golfistas, caminhantes, alpinistas, ciclistas – desportos que ase podem fazer durante todo o ano, graças ao clima suave da ilha.

Como arranque da retoma, trouxe para a ilha o Aviation-Event, Tenerife 2021 a conferência internacional para a indústria da aviação, que irá ter lugar para a semana, e onde irão presentes quase todos os decisores das companhias de aviação e dos aeroportos europeus.



Será que este evento vai ser o ponto de partida para a retoma? O Turismo de Tenerife está confiante que sim. Ainda há obstáculos a vencer, como por exemplo, a obrigatoriedade de testes COVID, tanto para entrar em Tenerife como para regressar aos países de origem, e que quarentenas, nalguns países após o regresso. Mas já se sentem os ventos da esperança.