Não queríamos ir contra a lei que proíbe a saída do concelho mas queríamos fazer uma caminhada junto ao mar. Temos a sorte de haver praias no concelho de Sintra e assim podermos fazer caminhadas na ou junto à praia sem infringir a lei. O plano era ir da praia da Adraga até à praia Grande sempre pelo topo da falésia.
O plano era deixar o carro no
estacionamento ao pé do restaurante da praia da Adraga e depois caminhar. Mas a meio da descida
para o restaurante, a estrada estava bloqueada… calculamos para impedir que as
pessoas fossem à praia. Junto à rede que estava a fechar a estrada, já havia
vários carros estacionados. Decidimos então também deixar o nosso. E em vez de
seguirmos em frente à praia da Adraga, resolvemos subir o caminho que estava
mesmo à nossa esquerda e que tinha uma seta a dizer “Cabo da Roca – 3200 m”. O
Cabo da Roca? Será que se poderia chegar, a pé, pelas falésias da Adraga ao cabo
da Roca?!
Lá subimos o íngreme caminho. Muito
vento. Mas mais vento houve quando chegámos ao topo, ao cima da falésia. Aí
sim, o vento era agreste, frio e forte. Lembrei-me que há largos anos também
tínhamos subido ao topo da falésia e que tínhamos visto um poço muito fundo com
uma ligação mar. Lá estava ainda. É o Fojo dos Morcegos. Agora todo protegido
para que ninguém lá caia abaixo. Mas fojo?
Nunca tinha ouvido a palavra. Fui então ao dicionário. “O Fojo é um
abismo aberto na rocha de onde se pode observar no fundo a agitação das ondas.”
Fojo dos Morcegos |
Como aquelas pedras são de origem calcária, vão
abrindo frechas e falhas pela ação corrosiva da água da chuva, conjugada com a ação
erosiva das ondas, que originam poços e cavernas, afunilados e profundos, até
chegarem ao nível do mar. Este fojo é tão profundo (90 metros!!!!) e tão escuro
que recebeu o nome de Fojo dos Morcegos. Há muitas lendas.
Crê-se que no fundo do Fojo dos Morcegos está uma nereida a cantar.
Uma outra lenda, do tempo dos romanos, diz-nos que os Romanos acreditavam existir um
Tritão a tocar búzio no fundo do Fojo - mas na realidade, o que se ouve são as ondas a bater nas rochas. O fenómeno foi tão interessante que foi enviada uma embaixada ao imperador
Tibério (entre o ano 14 e 34 d.C.) para relatar o que se passava naquele buraco.
Pensámos que haveria um caminho do Fojo até à praia da Adraga. Metemo-nos
por meios dos arbustos, mas não chegámos a lado nenhum – só serviu para
ficarmos com as pernas todas arranhadas.
Demos meia volta e
resolvemos ir então em direção ao Cabo da Roca, o Promontorium Magnum
dos Romanos, o ponto mais ocidental da Europa continental. O trilho percorre o topo da falésia e assim vamos sempre a ver o mar, cheio de ondas. Uma paisagem linda.
Mas sempre a subir e a descer, num percurso acidentado, por vezes pouco visível
no meio de arbustos (ai, as pernas!), que obriga a ir travando para não escorregarmos pelo caminho e a força nas de pernas nas subidas. Temos de descer um caminho cheio de pedras que também vai dar à Praia da Ursa, cujo nome deriva de um dos enormes calhaus do areal, que
lembra uma ursa a olhar o céu. Claro que também há uma lenda: Há vários milhões de anos, vivia aqui uma ursa
com seus filhotes. Quando o degelo começou, os Deuses pediram à ursa e a todos os
outros animais que abandonassem as zonas da costa, ordem que a ursa não
respeitou. A fúria dos Deuses foi tal que decidiram petrificar a ursa e os
filhos, e ali ficaram até hoje, representados no enorme rochedo e nos pequenos
que pontuam à sua volta.
Para ir para o Cabo da Roca, não é preciso descer até à praia. Subimos a encosta mas, a certa altura, o caminho no topo da
falésia termina e para chegar ao Cabo da Roca teremos de ir pela estrada de
terra batida. Resolvemos voltar para o carro. No caminho, feito em parte na estrada de batida, ao lado da
qual existem vinhas que fazem parte da Rota do Vinho de Calores e Carcavelos.
Foi uma caminhada linda. Ver do cimo da falésia o mar agitado em baixo é maravilhoso.