sábado, 21 de junho de 2014

8º dia do VIII Raid do Kwanza Sul: Quedas do Monte Negro – Quedas do Ruacaná (213 km)

De manhã, banho no rio Cunene. Mas banho a sério com sabonete e tudo. No único lugar protegido por troncos onde o jacaré não poderia entrar. Quando nós chegámos estavam ali nesse sítio dois soldados a fazer a higiene matinal. Ao lado havia uma pequena praia; pensei banhar-me ali. Logo os soldados e os locais me avisaram: “Aí nunca. Vem jacaré. É a hora de jacaré aparecer. Só pode mesmo lavar-se ali onde estão os soldados”. Esperei então que os soldados saíssem e entrei eu, qual ninfa ou princesa a banhar-se como nas lendas. Como na história do Gigante-cenoura: “No caminho, viu a filha do rei da Silésia a banhar-se no rio com as suas aias e ficou apaixonado.” (http://www.fnac.pt/Contos-e-Lendas-do-Mundo-Margarida-Pereira-Muller/a83700) Mas não, naquela manhã não passou pelo rio nenhum gigante, nem bruxo. Tomei banho em paz e sossego. Saída do banho, tal como eu casa, limpei-me à toalha e pus a minha loção. Entretanto, foi para o banho o cliente seguinte…

Entre o nosso acampamento e o rio Cunene havia algumas casas do kimbo. E passámos pelo local onde as pessoas fazem os tijolos de terra para com eles construírem as suas casas. Como na canção infantil alemã, „Wer will fleissige Handwerker sehn“: “Stein auf Stein, Stein auf Stein, das Häuschen wird bald fertig sein“ (https://www.youtube.com/watch?v=dt6YqvCylh4).

Como estamos na época do cacimbo, as quedas de água do Monte Negro praticamente não têm água e assim seguimos logo caminho após o pequeno-almoço. A picada continuava de pedra, mas a paisagem já era totalmente diferente. Já não era o deserto puro e duro, lembrava um pouco a savana, já com pequenas árvores.

Ao fim de 100 km chegámos à povoação de Angumbe, onde a caravana parou para fazer alguns donativos para a escola. Como o professor estava a almoçar, os donativos foram entregues junto do moderno posto de saúde ao soba. Os participantes do RAID estavam rodeados de homens e mulheres da tribo herero . Muitas crianças aproximaram-se para ver o que se estava a passar. Aproveitámos então esse grupo de crianças e contei-lhe ali a história guineense do Macaquinho do Narizito Branco (http://www.fnac.pt/Contos-e-Lendas-da-Lusofonia-M-Margarida-Pereira-Muller/a329582), que explica como os tambores apareceram na Terra.

Seguimos viagem até ao Chitado onde procurámos o monumento ao acidente da Força Aérea Portuguesa. A 10 de novembro de 1961, um avião Dakota da Força Aérea Portuguesa, com altas patentes portuguesas a bordo, passou por cima da pista do aeroporto do Chitado a baixa altitude. Levava os motores na potência de cruzeiro, o trem recolhido e bloqueado, pois não pretendia aterrar. De repente, a ponta da asa bateu numa árvore que sobressaía das outras cerca de 15 metros. O avião rodou sobre si mesmo, ficou em voo invertido, caiu, incendiando-se imediatamente. Todos os passageiros morreram.
Duas senhoras da povoação sabiam onde estava o monumento. A pedido do Lanucha, entraram no nosso jipe e levaram-nos lá – as senhoras estavam excitadíssimas de terem falado com o famoso General Lanucha que combateu valorosamente os sul-africanos quando estes invadiram o sul de Angola após a independência.

A cruz posta no local do acidente ainda lá está. A placa com o nome dos acidentados já desapareceu, assim como uma asa do avião que durante décadas ali ficou esquecida no meio da lavra.


A noite já caía e ainda nos faltavam 80 km.  Chegámos a Ruacaná, fronteira com a Namíbia já noite escura. O acampamento foi feito sobre um socalco de cimento. Por causa da escuridão, um participante caiu sobre a quina do cimento tendo esfolado os joelhos até ao osso – valeu-lhe a pronta intervenção da Irene Martins, médica gastroenterologista, que ali virou rapidamente uma fantástica enfermeira a fazer curativos de toda a espécie.