segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Uzbequistão - 7º dia




O despertador tocou às 2h45. Rapidamente nos vestimos, pusemos as últimas coisas na mochila e descemos. Entregámos a chave e pedimos o táxi para a estação de comboios. 

Os carros nao podem chegar mesmo à entrada da estação, deixando as pessoas a uns 100 m. Pouco prático quando está a chover e se tem malas. 

Entrar na estação é como entrar no aeroporto. Há um primeiro controlo de bilhetes, depois um controlo via raio X das malas e um novo controlo de bilhetes, desta feita com direito a carimbo. 

Tentámos ainda beber um café no bar da estação, mas este era intragável. Vieram-me à memória os versos da Nau Catrineta “deitaram sola de molho para no outro dia manjar, mas a sola era tão dura que não a puderam tragar”. Neste caso, “o café era tão mau que não o puderam beber”. 

Começámos a ver as pessoas a sair da sala de espera e a ir para as plataformas e resolvemos ir também. Na plataforma 1 estava o belo comboio Afrosiyob/ Talgo, de alta velocidade. Lindo, mas … ia para Samarcanda. A simpática hospedeira disse-nos que o nosso comboio para Khiva era na plataforma 2. Ai ja estava um comboio com aspeto muito velho, decrépito e cansado. Era o nosso. 

Tínhamos bilhetes em carruagens separadas (compráramos o que ainda havia disponível). Duas foram para a zona VIP e uma para a Económica. Um funcionário acompanhou-me até à carruagem 13. É uma carruagem-cama. Tudo às escuras. A única luz que entra vem do hall da carruagem. Nao há assentos , só camas em dois andares. Parece um transporte de pessoas em catres. 


Um calor excessivo. Tudo cheio. 

O funcionário apontou a minha cama e diz ao senhor que lá estava a dormir para sair. Só se ouve ressonar. 

O ar é pesado. Pus a minha máscara. Passado um pouco o funcionário regressou e entregou-me um saco com um lençol impecavelmente branco para a minha cama. Ao menos tenho um lençol limpo. 

O catre levanta-se e por baixo ha um compartimento para guardar os pertences.  


O nosso comboio não é de alta velocidade. Lembra o antigo comboio-correio que ligava Lisboa ao Algarve. Penosamente e com grande dificuldade rola sobre is carris, parecendo que não vai  chegar a lado nenhum. Talvez por isso pare em todas as estações e apeadeiros para ganhar fôlego e tentar ir um pouco mais depressa. 

Vou tentar dormir. A ver se consigo, mas na cama em frente um homem que deitado lembra o desenho da serpente quando engole o elefante  em O Princepezinho. Ressona como um urso 


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Adormeci. Acordei às 7h45. Já o dia tinha amanhecido há muito. Olhei pela janela e Fiquei maravilhada. Estávamos em pleno desejo de areia. Os carris cortam o deserto. Nada ha senão areia, areia, areia. 


Nada aqui cresce além de uns pequenos arbustos aqui e além. 

Resolvi ir à descoberta do comboio. Esta classe tem beliches paralelos à janela no lado esquerdo do comboio e perpendiculares à janela no lado direito. Há pessoas que tentam ter um  pouco de privacidade, colocando os lençóis à volta do beliche, fazendo uma espécie de casinha.  

Tal como nos comboios em outros países asiáticos, existe, no início de cada carruagem, uma fornaça alimentada a carvão que mantém um grande depósito sempre com água  a ferver. 



O comboio vai verdadeiramente apinhado. Fui da carruagem 13, a minha, à 7, a das minhas companheiras de viagem, e vi um único beliche vazio. As pessoas trazem o seu farnel e preparam o chá no comboio. A diferença para os comboios chineses, japoneses e vietnamitas é que não havia a comer massinha instantânea. 

A carruagem 8 é o restaurante. Cinco homens bebiam chá e comiam pão. 

Na carruagem 7 começa a classe VIP com cabines com quatro beliches. Algumas tinham a porta entreaberta e eu pude espreitar, mas não encontrei as minhas companheiras. Ainda gritei pelos nomes delas, mas, helàs, ninguém respondeu. Ainda tive a esperança que uma delas respondesse e me desse o meu farnel…

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5h30 depois da nossa partida de Bukhara, parámos em Khazorasp, uma cidade situada junto à margem esquerda do rio Amu Daria junto à fronteira com o Turquemenistão. 

Ao saírem do comboio, as pessoas deixam tudo impecável. Dobram  os lençóis e entregam-nos ao funcionário. Endireitam os colchões e põem a colcha. Tudo fica com aspeto arrumado e convidativo para o passageiro que entre que na estação em que eles saem. 


Os uzbeques são realmente muito gentis bem educados. 

Khazorasp, que em farsi significa “mil cavalos”, não tem a modernidade de Tashkent nem o peso histórico-cultural de Bukhara. É uma vila no meio da estepe, que vive, creio eu, da agricultura. Há campos de algodão, onde agora, terminada a colheita, pastam vagarosamente bois e vacas. Há muito gado bovino. As casas são humildes , muitas ainda feitas de adobe. 


Às 10h40 chegámos a Urgench e o comboio esvaziou-se. Fiquei sozinha na minha carruagem. Pela moderna estação ferroviária vê-se que Urgench é uma grande cidade neste ponto perdido no Uzbequistão.  

As pessoas transportam consigo imensas cousa: lava-loiças de alumínio, tábuas de engomar, impressoras, etc. 

Pelo que li, até há pouco tempo não havia comboio direto de Tashkent. Viajava-se até Urgench e depois tinha de se apanhar uma camioneta ou um táxi para Khiva. Agora ja há este serviço, mas pelos vistos poucos ter procurado. Aqui em Urgench deve ter entrado uma mão cheia de passageiros. O comboio segue praticamente vazio. 


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Inicialmente, Khiva não estava no nosso plano, mas alguém nos disse que valia a pena vir até esta aldeia num oásis. 


Khiva teve um papel fundamental na Rota da Seda, sendo a última paragem das caravanas antes da dura travessia do deserto iraniano.


O seu centro histórico, rodeado por muralhas de dez metros de altura e conhecido como Itchan Kala, é Património Mundial da Humanidade da Unesco.



Aqui parece que continuam a gostar muito de tirar fotografias em locais históricos por ocasião do casamento.