quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Uzbequistão - 9º dia



Começámos o dia a ver uma padeira a preparar os “somsa”, uns pastéis típicos uzbeques que podem ser recheados com carne (vaca, frango ou borrego) ou legumes (abóbora ou batatas).



Seguimos para a Dichan Kala (a parte baixa da cidade) com monumentos igualmente interessantes. 



Começámos pelo mercado de Khiva, que é todo ao ar livre. Pululava de vida. Mal se podia andar. As pessoas acotovelavam-se para poder avançar por entre as bancas de vendas. De quando em quando um grito de homens que, com carrinhos de mão, transportavam sacas de arroz ou qualquer objeto mais pesado. 



Não havia lógica alguma na atribuição das bancas. Se em Tashkent tudo estava organizado por tipo de produto a vender, aqui no bazar de Khiva, tínhamos bancas de detergentes ao lado de bancas de bolos que, por sua vez, tinham como vizinhos sapateiros, que estavam ao lado de talhantes. Entropia total. 


Tudo é vendido a granel : massas diversas,n-variedades de arroz, detergente para a máquina, chocolates , halva, até coscorões. Muito impressionantes são os berços para bebés que são tapados com panos muito espessos. Todos os berços têm um buraco. Calculamos que os bebés não usem fraldas e façam cocó diretamente pelo buraco para um bacio. 


Esta região, tal como muitas outras da Ásia Central, está cheia de histórias sobre a vida luxuosa dos khans e emires orientais. E, é claro, cada governante tentou cercar-se de palácios,  jardins maravilhosos e impressionantes salões reais. Para este propósito, foram convidados os artesãos mais habilidosos, joalheiros e artesanato arquitetónico.

Depois do bazar quisemos ir ver um palácio do século XIX. Não sabendo bem onde seria a entrada, perguntámos a uma rapariga que se cruzou connosco. A rapariga falava muito bem Inglês e dissemos-lhe. Ela agradeceu e perguntou donde éramos. Ao ouvir a resposta, disse: “Eu também sou portuguesa. Da Póvoa do Varzim. “ O espanto foi mútuo. Uma portuguesa a viajar sozinha pelo Uzbequistão!

O Palácio Nurullabay transmite a história de Khiva do final do século XIX e início do século XX e não é inferior a outros palácios em beleza e charme, brilho e esplendor. A história da construção do palácio é interessante.

Muhammad Rakhimkhan II (1845-1910) pediu a Nurullabay, um comerciante rico de Khiva, para lhe vender seu jardim. Nurullabay concordou, mas com uma condição: que  o nome do jardim permanecesse o mesmo. O Khan concordou. Assim, o nome Nurullabay foi preservado. Muhammad Rakhimkhan II decidiu construir um grande palácio de verão no território do jardim para seu filho favorito, Asfandiyar Khan (1871-1918).



Como só tínhamos a manhã livre, regressámos à parte cercada da cidade para almoçar e apanhar o táxi para a estação dos comboios. Enquanto nos preparávamos, olhámos para os bilhetes e apercebemo-nos de que estes não deveriam ser na classe VIP, como queríamos, mas em 2ª. Mais: viajaríamos na mesma carruagem, mas separadas umas das outras. 

Quando entrámos na estação, perguntámos à funcionária que via os bilhetes se seria possível ficarmos juntas. “Falem com o revisor. “

Meia hora antes da partida, as portas abriram-se e os passageiros puderam começar a embarcar. Perguntámos ao revisor responsável pela carruagem se poderíamos ficar juntas. O senhor não falava uma palavra de Inglês, mas percebemos que seria possível uma cabine se lhe pagássemos. Entrámos e ele apontou para a sua cabine. Cada revisor tem uma mini-cabine de trabalho e outra muni-cabine com um beliche para descansar. Era muitíssimo pequena, claustrofóbica . Abandonámos a ideia e ocupámos os nossos lugares/catres. O problema é que os nossos três lugares eram no andar de cima do beliche e não em baixo, mas como o comboio partiu praticamente vazio , instalámo-nos nos catres do andar inferior, pensando que conseguiríamos trocar com o passageiro que tivesse o catre inferior. 

À medida que se aproximava a hora da partida, o comboio começou a encher.  Chegou um homem que tinha o lugar da minha amiga. Nós tentámos explicar que ela não conseguia trepar para o andar de cima, nas o homem não se comoveu e exigia que a minha amiga saísse de imediato. O senhor não se comoveu e a minha amiga teve de libertar o lugar. 

A minha outra amiga começou a ficar ansiosa se lhe poderia acontecer o mesmo e decidiu voltar a negociar com o revisor. Este pediu 250 mil som (€25!!!!) por ceder a sua cabine. Tentámos negociar, baixar para 200 mil som, mas sem êxito. Acabámos por lhe dar 240 mil, dizendo-lhe que não tínhamos mais. Um belo suplemento ao seu ordenado e ainda por cima sem impostos! 

À hora certa o comboio partiu. Passados 20 minutos chegou a Urgench. Aqui entrou muita gente. Eu continuei deitada no meu catre a ler uma revista. A dada altura senti algum alvoroço à minha volta. Continuei concentrada na revista, mas o alvoroço aumentava até que senhora muito gorda, a cheirar muito a cebola, com muitas malas, embrulhos, sacos e saquinhos me tocou na perna e disse algo excitada, em russo, que aquele lugar era o dela e o meu seria o do andar superior. Sem responder, levantei-me, peguei na minha mochilinha e nos meus casacos e fui pedir abrigo às minhas amigas. Como elas não conseguiam subir para o catre superior, acolheram-me de braços abertos - desde que eu trepasse. Assim fomos as três numa cabine de 1,2 x 1,6 m de Urgench a Samarcanda. 9h. Muito divertido! Eu (quase) esticadinha e elas duas sentadas no catre. Comemos bolachas, cajus, bolos de frutos secos, bananas, tudo acompanhado pela melhor bebida do mundo: água (à falta de um bom cocktail…)

A paragem em Urgench foi muito longa, quase uma hora. Quando por fim partimos, apareceu na nossa cabine um outro revisor. Temi que nos viesse expulsar ou quiçá pedir algo mais. Mas não, só quis tirar a sua mala que estava debaixo do catre inferior. 

Os três revisores fizeram a viagem de cócoras no corredor…

As necessidades fisiológicas obrigaram-nos a utilizar a casa de banho. No final da carruagem havia duas casas de banho. Enquanto esperava pela minha vez , passou um jovem adulto com um monte de livrinhos que vendeu rapidamente , voltando pouco tempo depois com outro montinho. Eram romances de cordel. Quando regressei à cabine, várias pessoas estavam entretidas lendo os romances. A senhora muito gorda, que cheirava a cebola crua, lia a história em voz alta aos seus companheiros de viagem, enquanto estes comiam um belo piquenique. 

Na ocasião reparei que o marido tinha ocupado o meu lugar no catre superior…


Pontualmente às 3h25 o comboio chegou a Samarcanda. Saiu uma mão cheia de passageiros - dos quais só nós éramos turistas. O comboio vinha cheio de nacionais.  Todos os outros seguiram para Tashkent. O que leva a esta movimentação numa 4ª feira de novembro? 


Chegámos só hotel eram quase 4h. O senhor da recepção dormia no sofá. Rapidamente acordou e fez-nos o check-in. Ao contrário dos outros hotéis tivemos de pagar logo.